segunda-feira, 31 de outubro de 2011

BANDEIRAS, INTENÇÕES E METAS: uma leitura do texto “A GEOGRAFIA CRÍTICA E A CRÍTICA DA GEOGRAFIA” de Ana Fani A. Carlos



                                                                    Por : Eguimar Felício Chaveiro



O que fazer com meus pensamentos,
Se enquanto todos dormem, eles passeiam pela casa,
Brincam de esconde-esconde pelos quartos,
Aproveitando o escuro da madrugada?
Remexem nas gavetas, nos armários...
São crianças tolas e inconseqüentes..
,..não tem fronteira, nem porteira, nem cerca que os detenham..

                                                                                              Dóris Reis


Já se disse outras tantas vezes: o pensamento é pulso que alavanca decisões; matéria subjetiva que entremeia sentidos das ações – e lhes dão lume, prumo e direção; é plataforma mental que define pautas do sujeito em seu contato rente com o mundo objetivo; é artífice de representação da realidade, invocando o sujeito nas representações que faz fora; peça invisível que traz da cultura os nutrientes para que exista dentro; é, ademais, instrumento de interrogação, de procura de rumos – ou de absoluto extravio. Perdição. Bússola. Escapatória. Adentramento. Por isso, pensar é, para o sujeito contemporâneo, um  modo de se ter compromisso com a lucidez como é, na mesma proporção, possibilidade de ser capturado face aos embaraços do mundo do qual  se frutifica - e se enuncia. Pode-se invocar os versos: os pensamentos “não tem fronteira, nem porteira, nem cerca que os detenham”.

A par dessas considerações poder-se-ia, ao ler o texto de Ana Fani A. Carlos (2007) perguntar: o que fazer para que o pensamento geográfico, ou os modos de pensar instruídos pela geografia, possam adentrar “o mundo sem  porteira”, datado e espacializado sob a rubrica histórica do presente?

A professora e pesquisadora Fani (2007) levanta em seu texto algumas bandeiras ao cabo de uma reflexão que fundamenta a sua posição: ao levar em consideração que a geografia cultural, ou vertentes dela,  pretende uma “autonomização da esfera cultural”, ela torna-se adversária de uma “geografia que prima pela potência crítica e analítica”.

Mas é mais: no momento histórico reinante, marcado pela crise social em escala mundial, a crise teórica é apenas um sintoma de um “utopismo banal” que, no campo geral das ciências, e na raia específica da geografia, caracteriza-se pelo estilhaçamento do pensamento geográfico. São tantas geografias cujo armazém invisível parece não dar conta de guardar todos os predicativos: geografias menores, geografia sutil, geografia dos sabores, geografia socioambiental, geomática...   

O argumento da professora busca em Mezaros (2001) a significação abrangente: “ o capitalismo não tem uma missão civilizatória”. Logo a geografia brasileira, no viés teórico, ao abdicar-se do marxismo produz a sua ideológica por duas vias: abandona a totalidade, daí não ler o capitalismo; e abandona a reflexão da produção do espaço que envolve diretamente a ação do capital e do trabalho. Assim ideologicamente, justifica-se a aproximação do pensamento geográfico à burocracia de mercado.

Aliás, pontua Fani (2007), há duas direções para esse fim: a consecução de uma “geografia prática” a partir da crença no desenvolvimento sustentável e uma redução da leitura de natureza pela via do ambiente. No cerne da fratura é correspondente “uma febre de mapas”.

Uma geografia que apanha as contradições reais do mundo e se mobiliza para descortinar as ideologias e o lugar do Estado como entidade de classe ,demanda recriar a sua ambição pela totalidade e pela filosofia. Nasce, daí, a proposta de uma METAGEOGRAFIA cujas características podem ser delineadas:
a) que supere a redução da problemática espacial àquela da gestão do espaço com o objetivo de restituir a coerência do processo de crescimento;

b) que supere a atomização da pesquisa que se recusa a “habitar o tempo”, produzindo uma Geografia invadida pelas medidas da lógica produtivista;

c) contra a subjugação ao “saber técnico” que instrumentaliza o planejamento estratégico realizado sob a batuta do Estado, justificando sua política;

d) que ultrapasse o discurso ambiental que esvazia a relação sociedade-naturezaidentificando a dimensão social e histórica do espaço à sua dimensão natural;

e) que contemple o desvendamento da potência produtiva do capital, na rodução/reprodução do espaço em sua dimensão prática englobando, também asideologias que sustentam a sociedade do “bem estar” que reduz o sujeito a sua condição de consumidor na busca crescente de produtos novos, em espaços renovados;

f) que realize a crítica radical do existente restituindo o caminho do qualitativo, questionando a política do Estado e suas estratégias como momentos necessários do entendimento da crise atual e não subjugando os projetos de mudança à lógica do Estado. O horizonte delineado por Marx “na questão judaica” revela que a transformação radical da sociedade nega a política na medida que o político não foge as manifestações do controle burocrático que escapa ao controle democrático.

            Com as ideias lançadas sob o nome  METAGEOGRAFIA a partir do que Lebfvere denomina METAFILOSOFIA, Ana Fani A. Carlos (2007) defendera a sua tese de Livre Docência e ousou repercutir, com deliberação político-teórica, nos rumos da geografia brasileira.
           
Algumas questões levantadas pela professora, como a ortodoxia marxista e o componente cultural, a leitura da natureza mediante o interesse do mercado, o lugar da pesquisa geográfica e o seu vínculo institucional, por certo, recomendam um diálogo mais demorado entre nós – e todos. Possivelmente estas questões instalam outras  que, por aqui, temos feitos: como incluir numa mesma esfera de pensamento os conflitos da produção do espaço no capitalismo e os vínculos  com a vida do sujeito em suas múltiplas dimensões? Como sair também da institucionalidade marxista que pode brindar a realidade por meio de uma externalização do pensamento? Como não eximir-se do comprometimento institucional e do mercado de trabalho mantendo um crivo político e crítico no labor geográfico?

            Como versejou a minha amiga Dóris Reis, poeta trindadense, só se responde – “o que fazer com o meu pensamento” – ao delinearmos onde estamos e para onde se vai.Como o pensamento dela, o meu gosta de brincar e, às vezes, ousa dizer que é possível fazer uma geografia criativa, imaginativa, liberta – e libertadora, não fora do mundo, sem a sua influência, mas dentro dele, intensivo e engajadamente.

Um comentário:

  1. UM CONVITE ESPECIAL

    Vim cá, lê o seu blogue. Eu, tenho um. Muito simples, sem Cores e sem Nuances. Estou lhe convidando a visitar-me, e se possível, Seguirmos juntos por Eles. Estarei lhe esperando lá, afinal o que importa é a Amizade que fazemos e as publicações que expomos.



    Eu te Convido a vir Aqui www.josemariacosta.com

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