O
conceito de infância é uma definição relativamente recente na história da
humanidade. Até o século XII a criança não tinha nenhuma participação na vida social
nem era considerada como um ser integrante da família, já que, por conta da
falta de saneamento básico, ausência de vacinas e cuidados básicos muitas
crianças eram levadas a morte, antes mesmo dos dois primeiros anos de vida. As
crianças eram consideradas como “animaizinhos de estimação”, que animavam e
alegravam a casa, mas que no caso de sua morte precoce eram logo substituídas
por outra.
Além
disso, as crianças que conseguiam sobreviver eram logo integradas a vida
adulta, sem distinção de cuidados especiais para esta fase da vida. Portanto a
concepção de infância da antiguidade era bem distinta da atual, pois a partir
dos sete anos de idade, mais ou menos, as crianças já tinham responsabilidade
de auxiliar nos trabalhos domésticos e de aprender a profissão dos pais, além
de participarem de todas as questões dos adultos como festas, conversas.
Assim,
a criança era considerada como um “adulto em miniatura”, um ser “anônimo”, sem
direito a fala. Seres totalmente ignorados no convívio social e familiar. Não
se considerava que necessitava de cuidados especiais e específicos para este
momento da vida.
Com
a evolução social, econômica e cultural da humanidade, com os interesses da
igreja em disseminar os preceitos morais de sua doutrina, e com a criação da
escola como espaço de educação e lazer, as crianças começaram a ser olhadas de
uma maneira diferente.
A
partir do século XVII e XVIII as concepções de infância foram sendo delineadas
até se chegar a definição de que ainda hoje é utilizada de que a infância é uma fase da vida em que os
indivíduos precisam de cuidados especiais e devem estar resguardados de algumas
informações que podem lhes ser nocivas, para que se desenvolvam e se constituam
para o futuro como indivíduos (adultos) plenos. Esta fase varia do seu
nascimento até mais ou menos os dez a onze anos de idade, momento em que se
inicia a adolescência, fase com características muito específicas.
Durante
muito tempo a infância tem sido alvo de estudos e pesquisas e muitos tem sido
os investimentos para esta fase da vida. A criança passou a ser considerada
como um ser social passível de tratamento especial em todos os níveis. Na
educação muitos estudiosos como Piaget e Vigotsky (embora não fossem educadores
e sim psicólogos) se dedicaram a compreender como a mente da criança funciona e
como ela aprende. Na economia, na indústria, a criança é o foco de grandes
projetos de brinquedos, jogos eletrônicos, filmes, roupas, calçados e tantas
outras parafernálias direcionadas a elas tem sido desenvolvidas a cada dia, no
intuito de envolver mais e mais os pequenos infantes.
Na
prática, porém, na atualidade estamos vivenciando um movimento de retorno ou
retrocesso, ao momento em que o conceito de infância não era claro e definido.
Isto é o que Cordeiro 2012 denomina de “cenário de crise”, crise esta “baseada em fatores oriundos principalmente
da desfragmentação do núcleo familiar e do acesso ilimitado às informações próprias
do universo adulto”.
O
fenômeno da globalização, o alto índice de consumismo e a influência dos meios
de comunicação, junto ao público
infantil, tem levado a uma “adultização” das crianças, que a cada dia mais
aceleram o tempo de ser criança e são deixadas a exposição da vida adulta, da
moda, da violência, da prostituição, etc.
Na
mesma medida em que as crianças estão acelerando o processo de ser adulto
observamos que os adultos, por sua vez estão cada vez mais “infantilizados”, ou
seja: buscando medidas para se tornarem para sempre jovens. A não aceitação da
natureza humana, que traz na sua essência o processo de nascer, crescer,
amadurecer, envelhecer e morrer, tem sido cada vez mais negada por meio de
tantas técnicas de rejuvenescimento, cosméticos, vestimentas, cirurgias
plásticas entre outros.
Além disso, a busca desenfreada pela eterna
juventude é ressaltada, muitas vezes, por personalidades imaturas e infantis,
que por sua vez acabam por ser responsáveis pela formação das nossas crianças
que ficam perdidas neste emaranhado psicossocial a que estão expostas.
Portanto,
as questões a serem tratadas em relação à infância: corpo e arte vão muito além
da observação do conceito de infância e perpassa pela análise da sociedade de
consumo, deturpada e repleta de ilusões que atingem em cheio os relacionamentos
entre adultos e crianças. As relações de hoje entre pais e filhos, professores
e alunos, resultam no adulto de amanhã que é impregnado das impressões que
guardam de suas referências da infância, de seus heróis e de seus modelos.
A
infância é sim uma fase primorosa da vida do ser humano e como tal deve ser
considerada, para que não estejamos, nós adultos, formando as próximas gerações
inseguras, doentes, descontentes e revoltadas com sua condição humana.
Dóris Reis
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